Acontece na vida de todos nós:
queremos o melhor para os nossos,
mas nem sempre podemos dar o nosso melhor;
amamos e, às vezes, precisamos que alguém demonstre esse amor por nós.
Neste espaço vamos trocar ideias sobre cuidados especiais - com idosos, enfermos, recém nascidos,
pacientes pós cirúrgicos, pessoas com deficiência, pacientes terminais, portadores de demência,
grávidas de alto risco...
Pois cuidar do outro é, antes de tudo,
a arte de exercer carinho e boa vontade.

segunda-feira, 19 de dezembro de 2011


Reflexões sobre o abuso ao idoso

Entre as causas mais comuns de maltrato e negligência no cuidado com a pessoa idosa dependente está a falta de tempo do familiar e o que se pode chamar de “Síndrome do Queimado” com o cuidador principal.

Muitos idosos sofrem abusos e isso nos mostra que a violência no ser humano não discrimina as diferentes fases da vida. Muitas vezes, diante da necessidade de prover nossa família não sobra tempo para cuidar de nossos pais ou avós, como gostaríamos, porém acontece a tendência de confundir falta de tempo com negligência e abandono, e inclusive maltratos.

O abuso tem muitas formas, não apenas o maltrato físico ou psicológico, há também o abuso econômico  e a repressão da sexualidade do idoso. Estes aspectos também precisam ser considerados como forma de maltratos e normalmente essas situações acontecem de forma combinada.

Todos os tipos de maltrato, como mencionamos, podem acontecer de forma consciente ou inconsciente, uma vez que muitas famílias ou cuidadores não estão preparados para cuidar da pessoa idosa. A sobrecarga de trabalho em centros residenciais, devido ao excesso de tarefas podem ser uma causa comum que gera uma sequência de maltratos que às vezes passa despercebida, como uma violência subjetiva.

As pessoas idosas que normalmente sofrem maltratos estão na faixa dos 70 a 75 anos de idade e tem algum tipo de dependência. Na grande maioria, essa dependência se deve a problemas de saúde relacionados à idade, o que obriga o cuidador a estar o dia todo ligado a eles. Esse trabalho, agregado às outras atividades do cuidador, o cansaço e o estresse, fazem o quadro que podemos chamar de “Síndrome do Queimado”, que se pode traduzir numa pessoa esgotada, cansada e desiludida, que já perdeu sua capacidade de entrega, vocação ou ainda o sentido de responsabilidade na sua vida cotidiana. A relação entre pessoa cuidada e cuidador se deteriora a um ponto insustentável. É quando surge o abuso.

As necessidades primárias são parte dos cuidados de uma pessoa idosa (alimentação, higiene, vestuário...), mas não são as únicas. Às vezes o trabalho dos cuidadores centra-se apenas nessas necessidades, esquecendo de outras que tem a haver com a ‘completude emocional’, onde encontramos outras maneiras de cuidar que são: a escuta ativa, interessada; o afeto; o fomentar um senso crítico por meio da sociabilidade, a motivação para a participação em todos os aspectos da vida, mostrando ao idoso que ele é uma peça atuante da sociedade. Quem cuida desse coração que uma vez se entregou a seus filhos, que agora desfrutam do que lhes foi dado?

O agressor (a) raras vezes reconhece sua culpa, geralmente atribui a responsabilidade do maltrato à própria vítima, aproveitando-se muitas vezes da fragilidade defensiva e do estado de deterioração cognitiva em que se encontram muitos idosos – uma justificativa perfeita para a pessoa que agride.

Por outro lado, os idosos muitas vezes não são conscientes da situação de maltrato que estão vivendo. Estatísticas demonstram que oito em cada dez idosos consideram satisfatórias as relações que tem com seus familiares. Devido a laços emocionais, o idoso é incapaz de ser objetivo quanto ao tratamento que recebe de seu cuidador familiar. A sensação de fragilidade que sentem provoca medos que facilitam a predisposição a serem vítimas, favorecendo o terreno para que germinem os processos de violência. Segundo a Secretária de Segurança (Espanha), 90% dos casos de idosos vítimas de maus tratos não são denunciados, devido aos laços emocionais e dependências econômicas em relação a quem os maltrata. Os especialistas calculam que 5% dos idosos, na Espanha, são maltratados por pessoas no seu entorno mais íntimo. As denúncias aumentaram de forma importante nos últimos anos. De 1997 a 2000, os delitos cresceram 71,28% . E isto é só parte da realidade, pois muitos idosos maltratados não se atrevem a denunciar.

Muitos dos idosos estão vivendo longe de seus lares. Idosos que são cuidados por pessoas que são pagas para fazê-lo. Cuidadores profissionais que tem vocação para cuidar, mas há os que não tem esse dom. A contratação desses profissionais deve ser rigorosa, baseada em atitudes pessoais e não somente nos conhecimentos técnicos adquiridos. Não é só uma questão de ser produtivo, uma vez que não falamos de um trabalho realizado como mercadoria, numa linha de produção industrial, falamos do trato com pessoas, evidentemente uma tarefa muito mais profunda para a qual o empregado deve apresentar uma capacidade assertiva e de empatia elevada, que o faça ser capaz de prover todas as necessidades do usuário com quem estabelecerá uma relação de apoio e ajuda.

Muitas vezes,  os idosos abandonam o calor de seus lares, rodeados de suas coisas e suas rotinas, de suas velhas cadeiras, de seu gato, de seu passarinho e de seus vizinhos, situação tremendamente difícil para qualquer pessoa, tentando se adaptar a outro lugar, a outras regras, em lugares novos com pessoas diferentes. Se acrescentamos a essa situação a frieza, a incompreensão, a não escuta, a ausência de afeto e a visita que ‘nunca chega’...é suficiente para falar de maltrato.

Os familiares que decidem internar seu idoso (a) em um centro residencial (casa de repouso, asilo) não podem esquecer dele (a), as visitas são fundamentais. A visita gera ilusão, sentimentos de reconhecimento, de carinho, que nenhum profissional, por melhor que seja no realizar o seu trabalho, possa suprir. As visitas de entes queridos são a melhor vitamina para fortalecer o coração dos nossos idosos, a melhor defesa para evitar o isolamento, a negligência...a depressão.

Campanhas de sensibilização pretendem conscientizar a população, buscando influenciar positivamente a sociedade contra o maltrato aos idosos. Essas campanhas são um instrumento para prevenir e provocar a reflexão contra o maltrato, mas o passo mais importante desse movimento de sensibilização deve ser dado no âmbito das primeiras instâncias socializadoras: família e escolas. Na família, deve se implantar uma atitude de respeito ao idoso, como fonte de história, de vida, de experiência e sabedoria...retomando um estilo de educação que está sendo perdido, no qual a figura do idoso no contexto do lar era valorizada e respeitada. Na escola, deveriam ser realizadas mais atividades intergeracionais, não somente visitas a casas de repouso, mas projetos centrados na transmissão de sabedoria e conhecimentos, nos quais a criança comprovaria o quanto sabe seu avô, recuperando costumes e tradições enriquecedoras para as novas gerações e reconhecimento do valor dos idosos – o que lhes garantiria um ótimo nível de auto estima.

Resumindo, a intervenção social sobre este tema tão difícil deve centrar-se sobretudo na educação. Muitas instâncias socializadoras como a televisão lançam uma mensagem centrada na publicidade onde o “novo” é o que vale. Parece que o idoso é alguém que não pode escolher, o que é uma publicidade enganosa e irreal. Podemos falar de uma violência sutil, o ser humano se deixa degradar sem dar-se conta, esquecendo que tem direito a viver uma realidade tal qual como será quando seremos idosos. A sociedade necessita reciclar seus valores, a escala dos mesmos parece centrar-se no superficial e em tudo aquilo que pode se pode comprar ou vender.  A essência da pessoa passa inadvertidamente – ‘quanto você tem, quanto você vale’. A produtividade em divisas é o que nos preocupa, o idoso deixa de aportar esse tipo de riqueza que se traduz em benefícios quantitativos, portanto graças a esse tipo de atuações publicitárias a imagem da pessoa idosa é rechaçada, de forma consciente ou inconsciente, por uma grande  maioria da sociedade atual. Lembremos que foram nossos idosos que escreveram a história da qual somos, agora, os principais protagonistas, que foram eles/elas que fizeram mover o mundo, mas sobretudo, não esqueçamos que foram, são e serão pessoas que agora poderiam necessitar de você. E também não esqueça que amanhã você será idoso.

O maltrato é uma realidade demasiadamente oculta, que como ser humano temos o direito e o dever de denunciar. Calar significa seguir alimentando uma violência que rompe todos os demais direitos do ser humano.

Escrito por:
Mar Rey
Especialista em integração social 

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