Reflexões sobre o abuso ao idoso
Entre as causas mais comuns de
maltrato e negligência no cuidado com a pessoa idosa dependente está a falta de
tempo do familiar e o que se pode chamar de “Síndrome do Queimado” com o cuidador
principal.
Muitos idosos sofrem abusos e isso
nos mostra que a violência no ser humano não discrimina as diferentes fases da
vida. Muitas vezes, diante da necessidade de prover nossa família não sobra
tempo para cuidar de nossos pais ou avós, como gostaríamos, porém acontece a
tendência de confundir falta de tempo com negligência e abandono, e inclusive
maltratos.
O abuso tem muitas formas, não
apenas o maltrato físico ou psicológico, há também o abuso econômico e a
repressão da sexualidade do idoso. Estes aspectos também precisam ser
considerados como forma de maltratos e normalmente essas situações acontecem de
forma combinada.
Todos os tipos de maltrato, como
mencionamos, podem acontecer de forma consciente ou inconsciente, uma vez que
muitas famílias ou cuidadores não estão preparados para cuidar da pessoa idosa.
A sobrecarga de trabalho em centros residenciais, devido ao excesso de tarefas
podem ser uma causa comum que gera uma sequência de maltratos que às vezes
passa despercebida, como uma violência subjetiva.
As pessoas idosas que normalmente
sofrem maltratos estão na faixa dos 70 a 75 anos de idade e tem algum tipo de
dependência. Na grande maioria, essa dependência se deve a problemas de saúde
relacionados à idade, o que obriga o cuidador a estar o dia todo ligado a eles.
Esse trabalho, agregado às outras atividades do cuidador, o cansaço e o
estresse, fazem o quadro que podemos chamar de “Síndrome do Queimado”, que se
pode traduzir numa pessoa esgotada, cansada e desiludida, que já perdeu sua
capacidade de entrega, vocação ou ainda o sentido de responsabilidade na sua
vida cotidiana. A relação entre pessoa cuidada e cuidador se deteriora a um
ponto insustentável. É quando surge o abuso.
As necessidades primárias são
parte dos cuidados de uma pessoa idosa (alimentação, higiene, vestuário...),
mas não são as únicas. Às vezes o trabalho dos cuidadores centra-se apenas
nessas necessidades, esquecendo de outras que tem a haver com a ‘completude
emocional’, onde encontramos outras maneiras de cuidar que são: a escuta ativa,
interessada; o afeto; o fomentar um senso crítico por meio da sociabilidade, a
motivação para a participação em todos os aspectos da vida, mostrando ao idoso
que ele é uma peça atuante da sociedade. Quem cuida desse coração que uma vez
se entregou a seus filhos, que agora desfrutam do que lhes foi dado?
O agressor (a) raras vezes
reconhece sua culpa, geralmente atribui a responsabilidade do maltrato à
própria vítima, aproveitando-se muitas vezes da fragilidade defensiva e do
estado de deterioração cognitiva em que se encontram muitos idosos – uma
justificativa perfeita para a pessoa que agride.
Por outro lado, os idosos muitas
vezes não são conscientes da situação de maltrato que estão vivendo.
Estatísticas demonstram que oito em cada dez idosos consideram satisfatórias as
relações que tem com seus familiares. Devido a laços emocionais, o idoso é
incapaz de ser objetivo quanto ao tratamento que recebe de seu cuidador
familiar. A sensação de fragilidade que sentem provoca medos que facilitam a
predisposição a serem vítimas, favorecendo o terreno para que germinem os
processos de violência. Segundo a Secretária de Segurança (Espanha), 90% dos
casos de idosos vítimas de maus tratos não são denunciados, devido aos laços emocionais
e dependências econômicas em relação a quem os maltrata. Os especialistas
calculam que 5% dos idosos, na Espanha, são maltratados por pessoas no seu
entorno mais íntimo. As denúncias aumentaram de forma importante nos últimos
anos. De 1997 a 2000, os delitos cresceram 71,28% . E isto é só parte da
realidade, pois muitos idosos maltratados não se atrevem a denunciar.
Muitos dos idosos estão vivendo
longe de seus lares. Idosos que são cuidados por pessoas que são pagas para
fazê-lo. Cuidadores profissionais que tem vocação para cuidar, mas há os que
não tem esse dom. A contratação desses profissionais deve ser rigorosa, baseada
em atitudes pessoais e não somente nos conhecimentos técnicos adquiridos. Não é
só uma questão de ser produtivo, uma vez que não falamos de um trabalho
realizado como mercadoria, numa linha de produção industrial, falamos do trato
com pessoas, evidentemente uma tarefa muito mais profunda para a qual o
empregado deve apresentar uma capacidade assertiva e de empatia elevada, que o
faça ser capaz de prover todas as necessidades do usuário com quem estabelecerá
uma relação de apoio e ajuda.
Muitas vezes, os idosos
abandonam o calor de seus lares, rodeados de suas coisas e suas rotinas, de
suas velhas cadeiras, de seu gato, de seu passarinho e de seus vizinhos,
situação tremendamente difícil para qualquer pessoa, tentando se adaptar a
outro lugar, a outras regras, em lugares novos com pessoas diferentes. Se
acrescentamos a essa situação a frieza, a incompreensão, a não escuta, a ausência
de afeto e a visita que ‘nunca chega’...é suficiente para falar de maltrato.
Os familiares que decidem internar
seu idoso (a) em um centro residencial (casa de repouso, asilo) não podem
esquecer dele (a), as visitas são fundamentais. A visita gera ilusão,
sentimentos de reconhecimento, de carinho, que nenhum profissional, por melhor
que seja no realizar o seu trabalho, possa suprir. As visitas de entes queridos
são a melhor vitamina para fortalecer o coração dos nossos idosos, a melhor
defesa para evitar o isolamento, a negligência...a depressão.
Campanhas de sensibilização
pretendem conscientizar a população, buscando influenciar positivamente a
sociedade contra o maltrato aos idosos. Essas campanhas são um instrumento para
prevenir e provocar a reflexão contra o maltrato, mas o passo mais importante
desse movimento de sensibilização deve ser dado no âmbito das primeiras
instâncias socializadoras: família e escolas. Na família, deve se implantar uma
atitude de respeito ao idoso, como fonte de história, de vida, de experiência e
sabedoria...retomando um estilo de educação que está sendo perdido, no qual a
figura do idoso no contexto do lar era valorizada e respeitada. Na escola,
deveriam ser realizadas mais atividades intergeracionais, não somente visitas a
casas de repouso, mas projetos centrados na transmissão de sabedoria e
conhecimentos, nos quais a criança comprovaria o quanto sabe seu avô,
recuperando costumes e tradições enriquecedoras para as novas gerações e
reconhecimento do valor dos idosos – o que lhes garantiria um ótimo nível de
auto estima.
Resumindo, a intervenção social
sobre este tema tão difícil deve centrar-se sobretudo na educação. Muitas
instâncias socializadoras como a televisão lançam uma mensagem centrada na
publicidade onde o “novo” é o que vale. Parece que o idoso é alguém que não
pode escolher, o que é uma publicidade enganosa e irreal. Podemos falar de uma
violência sutil, o ser humano se deixa degradar sem dar-se conta, esquecendo
que tem direito a viver uma realidade tal qual como será quando seremos idosos.
A sociedade necessita reciclar seus valores, a escala dos mesmos parece
centrar-se no superficial e em tudo aquilo que pode se pode comprar ou
vender. A essência da pessoa passa inadvertidamente – ‘quanto você tem, quanto
você vale’. A produtividade em divisas é o que nos preocupa, o idoso deixa de
aportar esse tipo de riqueza que se traduz em benefícios quantitativos,
portanto graças a esse tipo de atuações publicitárias a imagem da pessoa idosa
é rechaçada, de forma consciente ou inconsciente, por uma grande maioria
da sociedade atual. Lembremos que foram nossos idosos que escreveram a história
da qual somos, agora, os principais protagonistas, que foram eles/elas que
fizeram mover o mundo, mas sobretudo, não esqueçamos que foram, são e serão
pessoas que agora poderiam necessitar de você. E também não esqueça que amanhã
você será idoso.
O maltrato é uma realidade
demasiadamente oculta, que como ser humano temos o direito e o dever de
denunciar. Calar significa seguir alimentando uma violência que rompe todos os
demais direitos do ser humano.
Escrito por:
Mar Rey
Mar Rey
Especialista em
integração social
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